Não me recordo quantos anos tinha quando dei meu primeiro golpe Meteoro de Pégaso. Era muito pequeno para entender que nada sairia dos meus punhos, mesmo se eu estivesse concentrando todo o meu cosmo naquela empreitada.

Durante a infância procurei as esferas do dragão, tentei trocar meu esqueleto por Adamantium, levantei meus óculos para ver se raios vermelhos sairiam deles, busquei alternativas para morfar em um Power Ranger, e cai até no golpe de comer espinafre, achando que teria um belo bíceps com uma âncora tatuada. Picada de aranha radioativa nem pensar – tenho pavor de seres com oito patas.

Mas de todos os superpoderes, o que mais desejei foi o de ler mentes. Inicialmente utilizaria meu cérebro telepático para saber se a Michelle realmente tinha sentimentos para comigo – naquela época, perguntar não era uma opção. Depois eu poderia buscar as respostas dentro da cabeça de cada professora, antecipando o que esperavam ouvir de mim. Esqueça os lápis com tabuadas, apague as colas bem escondidas nas borrachas!  Eu nunca mais decepcionaria alguém – nem a mim mesmo. 

Até tive um affair com a invisibilidade e com o teletransporte, porém a compreensão do pensamento do outro era algo muito mais invasivo e cativante.

Com o tempo as fantasias perderam sua essência e viraram um mero entretenimento recheado de efeitos especiais. Talvez ocorresse um surto coletivo caso fosse possível ler mentes. Porque se eu tivesse esse poder, quem garantiria que eu seria o único? Muito provavelmente as redes neurais entrariam em colapso, ninguém mais conversaria, e técnicas de supressão de pensamentos seriam novas minas de ouro. A meditação seria, inclusive, matéria obrigatória no currículo escolar.

Um dia desses, de céu azul em Curitiba (imagine o cenário apocalíptico), olho para o outro lado do terminal de ônibus do Portão, e vejo o Ratinho e o Rodrigo Faro estampados na fachada de uma clínica, me convidando para uma consulta odontológica. Talvez quisessem retirar meus dentes do juízo (final), quem sabe obturar algum resquício de cárie, pode ser até que iriam remover dente a dente (com uma alicate, enquanto o Xaropinho grita “rapaz!”), para me presentearem com uma dentadura dentro de um copo com água – uma bela decoração para minha mesa de cabeceira. 

Acontece que desejei novamente a capacidade de ler pensamentos. No que será que ambos apresentadores estavam pensando ao cederem suas imagens para um dentista? Vocês devem ter, com sucesso, respondido: dinheiro. Mas será que não há nada além disso? Sinceramente eu não imagino o Ratinho na frente do espelho passando o fio dental. Para mim, ele está mais para o senhor Wilson, com sua dentadura com chicletes no lugar da linha de frente.

Fui além. O que será que vem na cabeça da ex-namoradinha do Brasil? Aliás, que nomenclatura estranha para uma atriz. Não é a namorada, não é a esposa, não é a amante. No diminutivo, nem parece ter muita importância. 

Agora sério, porventura o que a Regina Duarte tinha na cabeça ao falar do pum do palhaço? Será que o Tiago Leifert realmente acredita que chegou ali por simples merecimento próprio? E o presidente do Brasil? Será que matou as aulas de história, realmente acredita no que fala, ou está tentando enganar a todo mundo? O Jeff Bezos sabe que sua empresa construiu um foguete, em formato de piroca, na base da exploração dos seus funcionários, não é mesmo? 

E o Lula? E o PT? – perguntaria o mais questionador de sapatênis.

Sim, e o Lula?!
O que passa na mente de Luís Inácio ao se reunir com Geraldo Alckmin? 
Gostaria muito de ler muitas mentes, porém enquanto não tenho superpoderes, é melhor eu escovar meus dentes com esmero. Não quero encarar o dentista novamente, especialmente se for o Ratinho com uma broca na mão.

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One thought on “Fio Dental Telepático

  • Bárbara 28 de dezembro de 2021 at 16:11

    Escovando meus dentes com muito esmero também…

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